Saltar para conteúdo principal
Registar
Entrar
Português English
Diário da República Eletrónico

Sábado, 6 de Março de 2021

Pesquisa Avançada
  • Página de Entrada
  • Pesquisa
  • Acórdão n.º 747/2014
Jurisprudência
  • Acórdão n.º 747/2014
  • Versão pdf
  • Imprimir

Acórdão n.º 747/2014

Publicação: Diário da República n.º 238/2014, Série II de 2014-12-10
  • Emissor:Tribunal Constitucional
  • Tipo de Diploma:Acórdão
  • Parte:D - Tribunais e Ministério Público
  • Número:747/2014
  • Páginas:30881 - 30882
Versão pdf: Descarregar
  • Sumário

    Não declara a inconstitucionalidade das normas do Decreto-Lei n.º 198/2012, de 24 de agosto (estabelece medidas de controlo da emissão de faturas e outros documentos com relevância fiscal, define a forma da sua comunicação à Autoridade Tributária e Aduaneira e cria um incentivo de natureza fiscal à exigência daqueles documentos por adquirentes pessoas singulares)

  • Texto

    Acórdão n.º 747/2014

    Processo n.º 1294/2013

    Acordam, em Plenário, no Tribunal Constitucional

    I - Relatório

    1 - A Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira requereu ao Tribunal Constitucional, nos termos do disposto na alínea g) do n.º 2 do artigo 281.º da Constituição da República Portuguesa, a declaração, com força obrigatória geral, da inconstitucionalidade do Decreto-Lei n.º 198/2012, de 24 de agosto, que estabelece medidas de controlo da emissão de faturas e outros documentos com relevância fiscal, define a forma da sua comunicação à Autoridade Tributária e Aduaneira e cria um incentivo de natureza fiscal à exigência daqueles documentos por adquirentes pessoas singulares.

    Para sustentar o seu pedido, alega a requerente, em síntese, que, na medida em que constituem matérias de interesse específico da Região Autónoma da Madeira, designadamente a "adaptação do sistema fiscal à realidade económica regional" [Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma da Madeira (EPARAM), artigo 40.º, alínea ff)], a aprovação pelo órgão legislativo governamental do Decreto-Lei n.º 198/2012, de 24 de agosto, devia ter sido precedida de audição dos órgãos de governo regional, como é exigido pelo artigo 229.º, n.º 2 da Constituição e também pelo artigo 89.º, n.º 1 do EPARAM.

    Ao não se ter ouvido a Região Autónoma da Madeira no procedimento legislativo que culminou com a aprovação e consequente publicação do Decreto-Lei n.º 198/2012, de 24 de agosto, o mesmo padece de inconstitucionalidade, por violação do dever de audição consagrado no artigo 229.º, n.º 2 da CRP, bem como por violação do artigo 36.º, n.º 1, alínea i), do artigo 40.º, alínea ff), e do artigo 89.º, n.º 1, todos do EPARAM, aprovado pela Lei n.º 13/91, de 5 de junho, na sua redação atual.

    2 - Notificado, nos termos e para os efeitos dos artigos 54.º e 55.º, n.º 3 da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro, na sua atual versão (LTC), o Primeiro-Ministro veio responder, tendo sustentado que o Decreto-Lei n.º 198/2012, de 24 de agosto não padece de inconstitucionalidade, devendo o pedido ser rejeitado.

    A posição sustentada pelo Primeiro-Ministro assenta em duas ordens de considerações.

    Desde logo, entende o Primeiro-Ministro que, no que respeita ao Decreto-Lei n.º 198/2012, de 24 de agosto, não existe obrigação constitucional de promover a audição dos órgãos regionais, uma vez que se não encontra preenchido o requisito "questão respeitante às regiões autónomas", estabelecido no artigo 229.º, n.º 2 da Constituição, tal como densificado na jurisprudência do Tribunal Constitucional. A esse propósito é feita referência ao acórdão n.º 304/2011. Sustenta o autor da norma que a questão regulada pelo Decreto-Lei n.º 198/2012, de 24 de agosto, relativa à criação de medidas de controlo da emissão de faturas e outros documentos com relevância fiscal e respetivas aspetos procedimentais, não diz respeito nem a interesses predominantemente regionais nem pressupõe um qualquer tratamento específico a nível regional, mantendo a Região Autónoma da Madeira sobre a matéria em causa um interesse equivalente ao do restante território nacional. O referido decreto-lei, ao alterar um conjunto de regras respeitantes à emissão e comunicação de faturas, contém um regime jurídico que se aplicará indiferenciadamente (aliás, por razões decorrentes do princípio da igualdade) a todos os sujeitos passivos do imposto que se encontrem em território nacional. Porque assim é, não existe interesse constitucionalmente relevante da Região Autónoma da Madeira suscetível de impor a sua audição específica.

    Ainda que deste modo se não entendesse - e nisto consiste o segundo argumento - sempre se dirá que a consulta levada a cabo previamente à aprovação da lei de autorização legislativa que habilitou o governo a legislar sobre a matéria permite, atendendo ao grau de pormenor do conteúdo da autorização (artigo 172.º da Lei n.º 64.º-B/2011, de 30 de dezembro), dar por substancialmente cumprido o requisito do artigo 229.º, n.º 2 da Constituição. Ora, tendo sido promovida a audição da Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira para que esta se pronunciasse no âmbito do procedimento legislativo parlamentar que culminou com a aprovação da Lei n.º 64.º-B/2011, de 30 de dezembro, verifica-se que esse órgão regional teve oportunidade de se pronunciar sobre o sentido e alcance do regime que veio a ser consagrado no Decreto-Lei n.º 198/2012, de 24 de agosto, tendo optado por não o fazer.

    Considerando a estreita margem de discricionariedade legislativa que a Assembleia da República deixou ao Governo através da pormenorização do sentido e alcance da autorização legislativa, seria evidente, na ótica do autor da norma, que a utilidade da pronúncia dos órgãos de governo da Região Autónoma da Madeira se esgotou bem antes da aprovação do Decreto-Lei n.º 198/2012, de 24 de agosto, pelo que a ocorrência de uma audição específica dos órgãos de governo regionais durante o procedimento de aprovação do decreto-lei autorizado se transformaria num mero ato ritual, formalidade sem qualquer sentido útil.

    Que não é esse o propósito da obrigatoriedade constitucional de audição prévia dos órgãos de governo das regiões autónomas poderia confirmar-se naquilo que o autor da norma considera ser uma orientação substancialista assumida pelo Tribunal Constitucional. Exemplificativo disso mesmo seriam os acórdãos n.os130/2006 e 346/2008.

    3 - Apresentado e discutido o memorando, nos termos dos n.os 1 e 2 do artigo 63.º da LTC, e fixada a orientação do Tribunal, cumpre elaborar acórdão nos termos do n.º 2 do mesmo artigo de harmonia com o que então se estabeleceu.

    II - Fundamentação

    Análise sumária do Decreto-Lei n.º 198/2012, de 24 de agosto

    4 - O Decreto-Lei n.º 198/2012, de 24 de agosto, procede à criação de medidas de controlo da emissão de faturas e outros documentos com relevância fiscal e respetivosaspetosprocedimentais, bem como à criação de um incentivo de natureza fiscal à exigência daqueles documentos por adquirentes que sejam pessoas singulares, alterando-se o Estatuto dos Benefícios Fiscais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 215/89, de 1 de julho, e efetuando-se um conjunto de alterações ao regime de bens em circulação objeto de transações entre sujeitos passivos de IVA, aprovado em anexo ao Decreto-Lei n.º 147/2003, de 11 de julho, alterado pelo Decreto-Lei n.º 238/2006, de 20 de dezembro, e pela Lei n.º 3-B/2010, de 28 de abril.

    De acordo com a respetiva exposição de motivos, as medidas constantes do decreto-lei refletem uma política legislativa destinada a reforçar o combate à informalidade e à evasão fiscal, bem como a auxiliar os contribuintes no cumprimento das suas obrigações fiscais. Pretende-se criar um instrumento eficaz para combater a economia paralela, alargar a base tributável e reduzir a concorrência desleal, promovendo-se a exigência de fatura por cada transação e reduzindo-se as situações de evasão fiscal associadas à omissão do dever de emitir documento comprovativo da transação. Para esse efeito, estabelecem-se procedimentos de comunicação dos elementos das faturas à Administração fiscal por via eletrónica de operações sujeitas a IVA.

    No que se refere ao incentivo de natureza fiscal, este tem por finalidade valorizar a participação dos adquirentes que sejam pessoas singulares na prevenção da evasão fiscal e na prossecução de um sistema fiscal mais equitativo.

    Dever de audição dos órgãos regionais

    5 - No artigo 227.º, n.º 1, alínea v), da Constituição inclui-se, entre os poderes das Regiões Autónomas, o de "pronunciar-se, por sua iniciativa ou sob consulta dos órgãos de soberania, sobre as questões da competência destes que lhes digam respeito, bem como, em matérias do seu interesse específico, na definição das posições do Estado Português no âmbito do processo de construção europeia". Por sua vez, e mais precisamente, o artigo 229.º, n.º 2, determina que "os órgãos de soberania ouvirão sempre, relativamente a questões da sua competência respeitantes às regiões autónomas, os órgãos de governo regional".

    A questão de saber se, no que respeita às medidas de controlo da emissão de faturas e outros documentos com relevância fiscal e respetivos aspetos procedimentais, bem como a criação de um incentivo de natureza fiscal à exigência daqueles documentos por adquirentes que sejam pessoas singulares, criadas pelo Decreto-Lei n.º 198/2012, de 24 de agosto, o Governo estava obrigado, por imposição da Constituição, à audição da Região, deve ser resolvida no quadro da jurisprudência consolidada do Tribunal Constitucional quanto ao entendimento a dar ao requisito "questão respeitante às regiões autónomas", estabelecido no referido artigo 229.º, n.º 2.

    De acordo com essa jurisprudência, que remonta ao Parecer n.º 20/77 da Comissão Constitucional (Pareceres da Comissão Constitucional, 2.ºVol., INCM, 1977, pp. 159 esegs.), sendo reiterada posteriormente em acórdãos deste Tribunal (v. Acórdão n.º 174/2009 e jurisprudência aí referida), "[...] são questões da competência dos órgãos de soberania, mas respeitantes às regiões autónomas, aquelas que, excedendo a competência dos órgãos de governo regional, respeitem a interesses predominantemente regionais ou, pelo menos, mereçam, no plano nacional, um tratamento específico no que toca à sua incidência nas regiões, em função das particularidades destas e tendo em vista a relevância de que se revestem para esses territórios".Ainda de acordo com essa jurisprudência, indícios "capazes de revelarem, no caso concreto, a existência de uma questão respeitante às Regiões Autónomas", no sentido indicado, serão, por exemplo, "a circunstância de o órgão de soberania, na disciplina que se propõe editar para determinada questão, circunscrever tal disciplina no âmbito regional" ou a de, "na regulamentação de determinada questão, se propor adotar uma solução especial no que toca às Regiões Autónomas, por referência à regulamentação geral que nessa matéria prevê para o restante território nacional".

    6 - Analisando a questão colocada ao Tribunal à luz do critério estabelecido na jurisprudência referida no ponto anterior, verifica-se, desde logo, que o regime jurídico decorrente das medidas criadas pelo Decreto-Lei n.º 198/2012, de 24 de agosto, não estabelece, ele próprio, qualquer especificidade relativamente às regiões autónomas. Trata-se antes de um ato legislativo que, pelo seu próprio objeto, respeita, por igual, a todo o território estadual.

    Justamente porque assim é, não procede, para o caso, a invocação do disposto no artigo 40.º, alínea ff) do EPARAM. De acordo com esta norma estatutária, constitui matéria de interesse específico da região - precisamente para efeitos, entre outros, da consulta obrigatória prevista no n.º 2 do artigo 229.º da Constituição - a "adaptação do sistema fiscal à realidade económica regional". Contudo, ao regular de modo homogéneo para todo o território nacional um regime que reforça o combate à informalidade e à evasão fiscal, o ato legislativo em questão não opera, ele próprio, qualquer "adaptação do sistema fiscal à realidade económica regional".

    Com efeito, de acordo com o critério estabilizado na jurisprudência constitucional, «a obrigatoriedade da audiência das regiões autónomas - rectius, dos seus órgãos - não surge logo que uma questão da competência dos órgãos de soberania «também» lhes interesse, ou seja, logo que tal questão tenha um relevo ou uma amplitude «nacional», e não meramente «continental»: é antes necessário e imprescindível que tal questão se apresente pelo menos com alguma especificidade ou peculiaridade relevante no que concerne a essas regiões» (Parecer n.º 2/82 da Comissão Constitucional (Pareceres da Comissão Constitucional, 18.ºVol., INCM, 1984, pp. 103-116, 107-108).

    Ora, não se vislumbra de todo em todo em que medida a criação de medidas de controlo da emissão de faturas e outros documentos com relevância fiscal e respetivosaspetosprocedimentais, designadamente os termos em que deve ser processada a comunicação dos elementos das faturas emitidas à Administração fiscal, assume uma relevância específica ou peculiar no que concerne à Região Autónoma da Madeira. O reforço dos mecanismos de combate à informalidade e à evasão fiscal interessam a essa região nos exatos termos em que interessam a todo o território nacional. O mesmo se diga no que respeita ao incentivo de natureza fiscal criado pelo diploma em apreço.

    Assim, tem-se por não verificado o requisito "questão respeitante às regiões autónomas", estabelecido no artigo 229.º, n.º 2 da Constituição, tal como densificado na jurisprudência do Tribunal Constitucional, pelo que inexistia qualquer obrigação constitucional de promover a audição dos órgãos regionais sobre a matéria objeto do Decreto-Lei n.º 198/2012, de 24 de agosto.

    Acresce referir que, em qualquer caso, a autorização legislativa concedida ao Governo para legislar sobre a matéria em causa, objecto do Decreto-Lei n.º 198/2012, de 24 de agosto, foi concedida pelo artigo 172.º da Lei n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro, que aprovou o Orçamento de Estado para 2012 - tendo aquele artigo definido, de acordo com as exigências constitucionais (artigo 165.º, n.º 2, da Constituição), o sentido e a extensão da autorização concedida. Ora o procedimento legislativo que conduziu à aprovação do Orçamento de Estado para 2012 contou com a participação dos órgãos das regiões autónomas. Tal participação ocorreu logo no início do procedimento, aquando da apresentação à Assembleia da República da Proposta de Lei n.º 27/XX (Diário da Assembleia da República, 2.ª série A, n.º 47/XX/1, de 17 de outubro de 2011), cujo artigo 162.º coincidia, integralmente, na sua redação, com o artigo 172.º da Lei n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro. Sobre esta redação - como sobre todo o restante texto da proposta de lei - foram ouvidos os órgãos das regiões e do Parecer emitido pela Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira quanto a todo o texto da Proposta de lei orçamental, datado de 7 de novembro de 2011 (disponívelemhttp://www.parlamento.pt/ActividadeParlamentar /Paginas/DetalheIniciativa.aspx?BID=36533), não consta nenhuma apreciação da autorização legislativa concedida ao Governo da República nos termos do artigo 162.º

    Resulta por isso claro que não obstante a inexistência de qualquer obrigação constitucional de promover a audição dos órgãos regionais sobre a matéria objeto do Decreto-Lei n.º 198/2012, de 24 de agosto, aqueles sempre tiveram oportunidade de se pronunciar, no momento adequado, sobre a matéria que viria a ser regulada no Decreto-Lei n.º 198/2012, de 24 de agosto, sem que nada, nessa altura, tivesse sido dito pelos órgãos da Região Autónoma da Madeira a este propósito.

    III - Decisão

    Nos termos e pelos fundamentos expostos, o Tribunal Constitucional decide não declarar a inconstitucionalidade das normas do Decreto-Lei n.º 198/2012, de 24 de agosto.

    Lisboa, 5 de novembro de 2014. - Maria José Rangel de Mesquita - Pedro Machete - Ana Guerra Martins - João Pedro Caupers - Fernando Vaz Ventura - Maria Lúcia Amaral - José Cunha Barbosa - Carlos Fernandes Cadilha - Maria de Fátima Mata-Mouros - Lino Rodrigues Ribeiro - Catarina Sarmento e Castro - João Cura Mariano - Joaquim de Sousa Ribeiro.

    208271018

Partilhe
Secções Relacionadas Análise Jurídica
  • Dados Gerais
  • Direito da União Europeia
  • Regulamentação
  • Modificações
  • Retificações
  • Newsletters Digesto
  • Mapa do site  ·  
  • Avisos Legais  ·  
  • Sugestões  ·  
  • Acessibilidade do site  ·  
  • Contactos  ·  
  • Ajuda 
Imprensa Nacional - Casa da Moeda
Presidência de Conselho de Ministros
Informações sobre a acessibilidade do portal Sistema Integrado para o Tratamento da Informação Jurídica

INCM, SA - Todos os direitos reservados