Acórdão de 6 de Outubro de 1994. Apêndice de 1997-04-18
- Data de Publicação:1997-04-18
- Emissor:Supremo Tribunal Administrativo - Decisões proferidas pela 1.ª Secção (Contencioso Administrativo) - Decisões em subsecção durante o 4.º trimestre de 1994
- Data em que foi Proferido:Acórdão de 6 de Outubro de 1994.
- Páginas:6669 - 6672
- Assunto: Deficiente civil das Forças Armadas. Regime estatuído pelos Decretos-Leis n.os 319/84, de 1 de Outubro, e 43/76, de 20 de Janeiro.
- Texto
Assunto:
Deficiente civil das Forças Armadas. Regime estatuído pelos Decretos-Leis n.os 319/84, de 1 de Outubro, e 43/76, de 20 de Janeiro.
Doutrina que dimana da decisão:
O reconhecimento do direito à percepção de uma pensão de invalidez a civis dependia da colaboração em operações militares de apoio às Forças Armadas nos antigos territórios do ultramar, desde que tivessem adquirido uma diminuição da capacidade geral de ganho em resultado de acidente nas condições definidas nos artigos 1.º e 2.º do Decreto-Lei n.º 43/76, de 20 de Janeiro.
Recurso n.º 32 741, em que são recorrente Amadeu Rodrigues e recorrido o Secretário de Estado da Defesa Nacional. Relator, o Exmo. Conselheiro Dr. Queiroga Chaves.
Acordam, em conferência, na 1.ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo (STA):
Amadeu Rodrigues, residente em Pombal, interpôs recurso contencioso do despacho de 17 de Maio de 1993 do Secretário de Estado da Defesa Nacional.
Na sua petição e alegações assaca ao acto recorrido vício de violação de lei, e após resumir a situação factual, assim conclui:
1.º Face à situação descrita e atendendo ao princípio da justiça material, a situação do recorrente encontra-se abrangido pelo artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 319/84, devendo ser considerado deficiente civil das Forças Armadas.
2.º Ao decidir em sentido contrário o acto recorrido violou este preceito.
O Secretário de Estado da Defesa Nacional não apresentou resposta nem alegações. O EMMP entende ser de negar provimento ao recurso por não se verificarem os requisitos legais para concessão do requerido.
Matéria de facto:
A) O recorrente, funcionário da Junta Autónoma de Estradas de Angola (JAEA), desempenhava as funções de operador de máquinas na construção da "picada" Lumbala-Lucusse, em 1973, em Angola.
B) Em 7 de Outubro de 1973, domingo, cerca das 17 horas, a viatura da JAEA que conduzia, transportando pessoal empenhado na abertura daquela "picada", accionou uma mina anticarro que provocou danos materiais, dois mortos e quatro feridos nos elementos da JAEA.
C) Em consequência do acidente, o recorrente ficou com graves ferimentos, sendo evacuado por via aérea, para o Hospital do Luso, onde lhe foi amputada a perna esquerda, a que corresponde uma desvalorização de 83,375%.
D) Aquela "picada" ou estrada foi aberta pela JAEA e tinha protecção local das forças militares.
E) Este itinerário revestia-se de muita importância para as forças militares, permitindo uma ligação rodoviária directa entre Cazombo e Luso e facilitando de forma muito sensível, relações entre as populações do saliente do Cazombo e o Luso dado o encurtamento de distâncias e a sua não dependência em relação ao Caminho de Ferro de Benguela (fl. 70 do processo instrutor).
F) Em 2 de Novembro de 1984 o recorrente requereu ao Ministro da Defesa Nacional que fosse considerado deficiente civil das Forças Armadas (fl. 2 do processo instrutor).
G) Após ter sido instruído o respectivo processo foi elaborada a informação n.º 540/88, de 21 de Outubro, do Serviço de Justiça da Região Militar do Centro no sentido de não ser atribuído ao recorrente o estatuto de deficiente civil das Forças Armadas (fl. 58 a fl. 59 do processo instrutor).
H) O despacho de 25 de Outubro de 1988 do segundo-comandante da Região Militar do Centro concordou com esta informação e por isso indeferiu o requerido (fl. 590 do processo instrutor).
I) Após relatório, foi elaborado o relatório a fl. 82 do processo instrutor e a fl. 82 v.º foi lavrado o "despacho concludente subsidiário" de 20 de Julho de 1989.
J) Na informação n.º 536/89, de 13 de Setembro, do Serviço de Justiça da Região Militar do Centro entende-se que o acidente deve ser considerado em campanha (fl. 84 do processo instrutor), sendo neste sentido o despacho do segundo-comandante da Região Militar do Centro de 19 de Setembro de 1984 (fls. 84 v. do processo instrutor).
L) A Repartição de Justiça e Disciplina elaborou a informação n.º 77, de 23 de Fevereiro de 1993, que está no início do processo instrutor que é no sentido de homologar o parecer n.º 676/92, de 2 de Dezembro, da Comissão Permanente para Informação e Pareceres, que era no sentido de considerar o recorrente como incapaz de todo o serviço militar com uma desvalorização de 83,375% que resultou das lesões sofridas no acidente ocorrido em Angola, em 7 de Outubro de 1993, quando ao serviço da JAEA e sob protecção das FMP, destacadas como protecção do pessoal e das obras em execução.
M) Em 17 de Maio de 1993 o Secretário de Estado da Defesa Nacional proferiu o seguinte despacho:
"Concordo com a informação e, em consequência, não qualifico o civil Amadeu Rodrigues, deficiente civil das Forças Armadas pelo artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 319/94, de 1 de Outubro, designadamente o de que no momento em que se deficientou não estava a colaborar com as Forças Armadas numa operação militar de apoio às mesmas."
O Direito:
A questão a dirimir neste processo prende-se com a verificação dos requisitos previstos no artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 319/84, de 1 de Outubro, para o reconhecimento do direito à percepção de uma pensão de invalidez a civis que, "colaborando em operações militares de apoio às Forças Armadas nos antigos territórios do ultramar, adquiram uma diminuição da capacidade geral de ganho em resultado de acidente ocorrido nas condições definidas nos artigos 1.º e 2.º do Decreto-Lei n.º 43/76 de 20 de Janeiro".
Estes preceitos definem o deficiente das Forças Armadas, convindo agora reter que ele é o cidadão que no cumprimento do serviço militar e na defesa dos interesse da Pátria adquiriu uma diminuição na capacidade geral de ganho; quando em resultado de acidente ocorrido em serviço de campanha ou em circunstâncias directamente relacionadas com o serviço de campanha; no exercício das suas funções e deveres militares e por motivo do seu desempenho, em condições de que resulte, necessariamente, risco agravado equiparável ao definido nas situações previstas noutros itens do artigo 1.º, vem a sofrer, mesmo a posteriori, uma diminuição permanente, causada por lesão ou doença, adquirida ou agravada.
O "serviço de campanha" tem lugar no teatro de operações onde se verifiquem operações de guerra, de guerrilha ou de contraguerrilha e envolve as acções directas do inimigo, os eventos decorrentes de actividade indirecta do inimigo e os eventos determinados no decurso de qualquer outra actividade terrestre, naval ou aérea de natureza operacional.
As "circunstâncias directamente relacionadas com o serviço de campanha" têm lugar no teatro de operações onde ocorram operações de guerra, guerrilha ou de contraguerrilha e envolvem os eventos directamente relacionados com a actividade operacional que pelas suas características impliquem perigo em circunstâncias de contacto possível com o inimigo e os eventos determinados no decurso de qualquer outra actividade de natureza operacional, ou em actividade directamente relacionada, que pelas suas características possam implicar perigosidade.
Sendo este o regime geral há agora que verificar se a factualidade que ocorreu e se deixou consignada é de molde a preencher a previsão legal.
Não sofre qualquer dúvida que o recorrente sofreu uma deficiência física que diminuiu a sua capacidade geral de ganho em consequência do acidente ocorrido quando trabalhava para a JAEA na abertura de uma "picada" e com protecção local das Forças Armadas, já que tal itinerário revestia-se de muita importância para elas.
Porém este factos só por si são insuficientes para caracterizar uma situação de colaboração em operações militares de apoio às Forças Armadas, já que não basta que estas estivessem a dar protecção à construção da estrada, visto que, como se sabe, a protecção às populações civis em Angola, era uma das missões das Forças Armadas.
Não se prova e nem isso é sequer alegado pelo recorrente, que a "picada" a construir tenha sido ordenada ou mesmo a pedido das Forças Armadas no âmbito da logística própria para efectivação das suas operações militares ou pelo menos para as facilitar.
O que parece resultar dos factos é que a construção da estrada era de iniciativa da JAEA e somente contava com a protecção das Forças Armadas a nível local.
Sendo assim tem de se concluir que no momento em que o acidente ocorreu, o recorrente não colaborava em operações militares de apoio às Forças Armadas como exige o artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 319/84 para que possa ser considerado como deficiente civil das Forças Armadas.
Foi neste sentido o despacho recorrido que assim está conforme às disposições legais citadas.
Nestes termos e tudo considerado, nega-se provimento ao recurso.
Custas pelo recorrente fixando-se a taxa de justiça em 10 000$00 e a procuradoria em 50%.
Lisboa, 6 de Outubro de 1994. - João Rolando Viana Queiroga Chaves (relator) - Ilídio Gaspar Nascimento Costa. - Serafim Edmundo da Silva. - Fui presente, Soares Póvoa.